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Comece por aqui

Eu comecei do começo: pela desistência. Todos os dias eu pegava meu carrinho e me dirigia à escola que eu amava, feliz da vida. Sim, dava sono, era cedo e toda vez que eu parava no sinaleiro alguém assoprava para fora do carro uma nuvem de fumaça: cigarro, vape, sei lá. Aquilo me dava uma sensação de coisa errada – toda aquele toxicidade vindo com o primeiro ar da manhã. Talvez essa nuvem tão moderna tenha me aberto os olhos. Defendi o mestrado em Literatura Comparada meio entre corres de sala dos professores e afins – eu conseguia manejar, às vezes mais, às vezes menos.


Me demiti da escola. Foi fácil e difícil; desistir é assim. Tomar a decisão foi terrível – me despedir dos alunos e colegas foi pior. Mas depois tudo se fez. E assim fui, para ficar sozinha no quarto. Notando de olhos bem abertos qual o tamanho do silêncio – silêncio esse que me fazia falta lá na escola, entre gritarias e barulhos. Mas aqui, sozinha, o nada foi ficando grande demais.


Eu gosto de sair de casa de conversar. Gosto de escolher os brincos do dia, a maquiagem, a combinação entre tudo – se o sapato vai fazer sentido com a chuva daquele dia. Gosto de me fantasiar. E em casa, no espaço privado, não há fantasia que se sustente. Não pra mim. Tentei nos primeiros dias me arrumar para trabalhar, escrever a tese, ver brilho na vida de pesquisadora. Duraram poucos dias – e aí o que restava era pijama, sono e tristeza. Isso eu não aguento. Eu não tolero perder a vida assim, de mão beijada, sem gritar antes. Chega, eu disse. E toda vez que eu chego nesse ponto, acontece algo de maravilhoso – eu me refaço só quando perco a paciência, parece. Que bom que sou ariana, então.


Troquei ideia com um amigo de uma amiga que tinha um espaço cultural. Eu queria dar aula de novo, vestir a fantasia mais preciosa de todas, essa que eu uso para falar alto e andar de batom vermelho e dizer o que penso. Precisava de um palco – ele me concedeu a finada e querida Casa Pagu, lugar que faz falta aqui em Londrina. Abri as inscrições com certeza de que não ia dar ninguém. Me imaginava sozinha e arrumada, coque pra cima, esperando alguém que nunca chega. Mas rolou – e aí já enchemos 10 vagas de uma vez. A ideia era escrever e publicar uma coisinha simples, só pra família.


Vendemos mais de 100 livros na festa de lançamento. No mesmo dia que lançamos a editora. Um milagre. Conseguimos, eu e uma amiga fiel, Isadora Berbel, profissionalizar o negócio, com ajuda da ilustradora Nani Vasques e as capas que foram feitas pelas duas.


Foi tão lindo, uma realização. Foi vestir a fantasia para tirá-la, olhar a realidade. Para mim, como professora, foi uma experiência de liberdade. Olhar para fora do carro numa manhã fria e ver nuvens era o máximo de horizonte que eu tinha. Aí eu trabalhava várias horas numa versão infértil de sala de aula – aquela coisa rápida e prática. E a magia parava por aí - no máximo, uma cartolina com glitter.


A oficina me deu tempo, razão e sentido de volta. As aulas eram longas – eu não precisava ter pressa. Tínhamos nosso maravilhoso coffee break – eu não precisava ter fome. Os alunos queriam e podiam estar ali – eu não precisava obrigá-los. E eles reluziam. Acredito que para eles também tenha sido algo libertador: poder escrever e dizer o que se acha em voz alta. Tem gente que passa pela vida sem nunca ter feito isso. É isso: a Editora é contra o silêncio. Ele fica grande demais.


Meu horizonte se expandiu. Hoje as nuvens são outras: coloridas, fortes, puras. Me levam pra longe.


Obrigada a quem fez parte dessa história. Espero poder compartilhar tudo o que aprendi enfrentando o silêncio. Aliás, eu não só enfrentei: eu desisti dele.

 
 
 

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